Wednesday, December 28, 2016

monangambé


monangambé


Naquela roça grande
não tem chuva
é o suor do meu rosto
que rega as plantações;
Naquela roça grande
tem café maduro
e aquele vermelho-cereja
são gotas do meu sangue
feitas seiva.
O café vai ser torrado
pisado, torturado,
vai ficar negro,
negro da cor do contratado.
Negro da cor do contratado!
Perguntem às aves que cantam,
aos regatos de alegre serpentear
e ao vento forte do sertão:
Quem se levanta cedo?
quem vai à tonga?
Quem traz pela estrada longa
a tipóia ou o cacho de dendém?
Quem capina e em paga recebe desdém
fuba podre, peixe podre,
panos ruins, cinquenta angolares
"porrada se refilares"?
Quem?
Quem faz o milho crescer
e os laranjais florescer?
- Quem?
Quem dá dinheiro para o patrão comprar
máquinas, carros, senhoras
e cabeças de pretos para os motores?
Quem faz o branco prosperar,
ter barriga grande
- ter dinheiro?
- Quem?
E as aves que cantam,
os regatos de alegre serpentear
e o vento forte do sertão
responderão:
"Monangambééé..."

Ah! Deixem-me ao menos subir às palmeiras
Deixem-me beber maruvo
e esquecer diluído
nas minhas bebedeiras

  "Monangambéé...''

António Jacinto -Poemas, 1961



Muadiakimi/Birin Birin


quem tá gemendo
Quem tá gemendo,
Negro ou carro de boi?
Carro de boi geme quando quer,
Negro, não,
Negro geme porque apanha,
Apanha pra não gemer...

Gemido de negro é cantiga,
Gemido de negro é poema...

Gemem na minh′alma,
A alma do Congo,
Da Niger, da Guiné,
De toda África enfim...
A alma da América...
A alma Universal...

Quem tá gemendo,
negro ou carro de boi?


Solano Trindade
Poemas d'uma vida simples 1944




adeus à hora da largada

Minha mãe
(todas as mãe negras
cujos filhos partiram)
tu me ensinaste a esperar
como esperaste nas horas difíceis

Mas a vida
matou em mim essa mística esperança

Eu já não espero
sou aquele por quem se espera

Sou eu minha Mãe
a esperança somos nós
os teus filhos
partidos  para uma fé que alimenta a vida

Hoje
somos as crianças nuas das sanzalas do mato
os garotos sem escola a jogar a bola de trapos
nos areias ao meio-dia
somos nós mesmos
os contratados a queimar vidas nos cafezais
os homens negros ignorantes
que devem respeitar o homem branco
e temer o rico
somos os teus filhos
dos bairros de pretos
além aonde não chega a luz eléctrica
os homens bêbedos a cair
abandonados ao ritmo dum batuque de morte
teus filhos
com fome
com sede
com vergonha de te chamarmos Mãe
com medo de atravessar as ruas
com medo dos homens
nós mesmos

Amanha
entoaremos hinos à liberdade
quando comemorarmos
a data da abolição desta escravatura

Nós vamos em busca de luz
os teus filhos Mãe
(todas as mães negras
cujos filhos partiram)
vão em busca de vida.




muimbo ua sabalu


Mon'etu ua kassule
Akutumissa ku San Tomé
Mon'etu ua kassule
Ua kutumissa ku San Tomé

Kuexirié ni ma documentu
Aiué, aiué
Kuexirié ni ma documentu
Aiué, aiué

Mon'etu ua ririlé
Mama ua sanukilé
Mon'etu ua ririlé
Mama ua sanukilé

Aiué, aiué
akutumissa ku San Tomé
Aiué, aiué
akutumissa ku San Tomé

Mon'etu ua kassule
akutumissa ku San Tomé
Mon'etu ua kassule
akutumissa ku San Tomé

Kuexirié ni ma documentu
Aiué, aiué
Kuexirié ni ma documentu
Aiué, aiué

Mon'etu uai kia
Uai imu pulaia
Mon'etu uai kia
Uai imu pulaia

Aiué, aiué
akutumissa ku San Tomé
Aiué, aiué
akutumissa ku San Tomé

Mon'etu ua kassule
akutumissa ku San Tomé
Mon'etu ua kassule
akutumissa ku San Tomé

Kuexirié ni ma documentu
Aiué, aiué
Kuexirié ni ma documentu
Aiué, aiué

Mon'etu ua dirilé
Mama ua salukilé
Mon'etu ua dirilé
Mama ua salukilé

Aiué, aiué
akutumissa ku San Tomé
Aiué, aiué
akutumissa ku San Tomé

Mon'etu ua kassule
akutumissa ku San Tomé
Mon'etu ua kassule
akutumissa ku San Tomé

Kuexidié ni ma documentu
Aiué, aiué
Kuexidié ni ma documentu
Aiué, aiué

Mon'etu uai kia
Uai imu pulaia
Mon'etu uai kia
Uai imu pulaia

Aiué, aiué
Ua kutumissa ku San Tomé
Aiué, aiué
Ua kutumissa ku San Tomé
Aiué, aiué
Ua kutumissa ku San Tomé
Aiué, aiué
Ua kutumissa ku San Tomé
Aiué, aiué, aiué
Ua kutumissa ku San Tomé
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(Nosso filho caçula
Mandaram-no pra S. Tomé
Não tinha documentos
Aiué!
(Nosso filho chorou
Mamã enlouqueceu
Aiué!

Mandaram-no pra S. Tomé
Nosso filho partiu
Partiu no porão deles
Aiué!

Mandaram-no pra S. Tomé
Cortaram-lhe os cabelos
Não puderam amarrá-lo
Aiué!

Mandaram-no pra S. Tomé
Nosso filho está a pensar
Na sua terra, na sua casa
Mandaram-no trabalhar
Estão a mirá-lo, a mirá-lo
—Mamã, ele há-de voltar
Ah! A nossa sorte há-de virar
Aiué!

Mandaram-no pra S. Tomé
Nosso filho não voltou
A morte levou-o
Aiué!)

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